Cobrança pode ser exigida de funcionários sindicalizados ou não, mas precisa passar por aprovação; especialistas apontam insegurança jurídica e retrocesso
O Supremo Tribunal Federal (STF) validou a volta da contribuição assistencial na noite de segunda-feira (11). A decisão foi por 10 x1, com votação em plenário virtual.
O pagamento aos sindicatos não é obrigatório, mas o trabalhador deve manifestar oposição caso não queira contribuir.
Com a decisão do STF, a contribuição poderá ser exigida de todos os trabalhadores — sindicalizados ou não. Contudo, para ter validade, deve constar em acordos ou convenções coletivas firmados entre sindicatos de trabalhadores e patrões.
A decisão sempre precisa passar por aprovação dos empregados, que homologam ou não o teor, em assembleia.
Uma vez instituída a cobrança, é preciso que a convenção coletiva estabeleça também como vai funcionar o direito do trabalhador de se opor ao desconto do valor.
Normalmente, se estabelece um prazo de 10 dias para que o trabalhador manifeste seu desejo de não contribuir. Em geral, o empregado deve ir presencialmente ao sindicato para fazer isso.
O valor varia. Em geral, é de uma porcentagem pequena do salário do trabalhador, com algum teto. Por exemplo, 1% da remuneração, com limite de R$ 50.
Para quem não se opõe, o pagamento é feito diretamente pela empresa por meio de desconto na folha. Os valores recolhidos são repassados aos sindicatos — mensalmente ou em outra periodicidade.
A contribuição assistencial é destinada ao custeio de atividades de negociações coletivas do sindicato, como as tratativas com patrões por reajuste salarial ou pela extensão de benefícios, como auxílio-creche.
Os resultados e eventuais conquistas dessas negociações se estendem a toda a categoria, independentemente de o trabalhador ser sindicalizado ou não.
O julgamento no Supremo não tem relação com a contribuição sindical, também conhecida como “imposto sindical”, que deixou de ser obrigatória depois da reforma trabalhista, de 2017.
Especialistas apontam retrocesso
Especialistas consultados pela CNN apontam que a cobrança pode acarretar insegurança jurídica e representa um retrocesso.
Na avaliação de Ronan Leal Caldeira, do GVM Advogados, a decisão “cria retrocesso e insegurança jurídica, levando trabalhadores não filiados a terem maior dificuldade para expressar sua contrariedade com a cobrança e, assim, evitar o desconto em folha de pagamento”.
Yuri Nabeshima também reitera que a regra pode criar insegurança jurídica. Ela aponta que são recorrentes às empresas dúvidas quanto à obrigatoriedade ou não do pagamento dessas taxas. Segundo a advogada, as mudanças recorrentes pioram o cenário.
Márcio Takuno, advogado trabalhista do Evangelista, Takuno, Parmijano e Rosa Advogados, destaca que o grande prejudicado pela volta desta cobrança é o próprio trabalhador.
“A empresa figura como mera intermediária, repassando o valor descontado ao sindicato por meio de pagamento de boleto emitido pela entidade sindical. O empregado é o único impactado, pois o desconto é do seu salário.”
Cássia Pizzotti, do escritório Demarest Advogados, discorda de que a mudança causaria um retrocesso. Segundo ela, o efeito seria o fortalecimento da representação sindical, com “amadurecimento do conceito por trás da reforma trabalhista”.
“Em relação às empresas, elas devem ter maior segurança jurídica, já que isso evitará conflitos que decorrem naturalmente de tema tão controverso como esse. Sob o ponto de vista financeiro, não há impacto às empresas, já que se trata de contribuição imposta à categoria profissional”, argumenta.
Entenda o julgamento
O STF confirmou em 2017 a inconstitucionalidade da cobrança da contribuição assistencial a trabalhadores não sindicalizados. Agora, com a decisão do STF, os ministros mudaram o posicionamento do Tribunal a respeito do tema.
Isso porque a reforma trabalhista, do mesmo ano de 2017, mas posterior ao julgamento do STF sobre a contribuição assistencial, tornou facultativa a cobrança de outra contribuição: a sindical, que tinha natureza tributária e era cobrada de todos os trabalhadores.
Também conhecida como “imposto sindical”, a contribuição equivalia à remuneração de um dia de trabalho do empregado.
A proposta de mudança de entendimento sobre o tema partiu do ministro Roberto Barroso. O magistrado entendeu que, depois da Reforma Trabalhista, “os sindicatos perderam a sua principal fonte de custeio”.
“Esse esvaziamento dos sindicatos, por sua vez, vai na contramão de recentes precedentes do STF, que valorizam a negociação coletiva como forma de solucionar litígios trabalhistas”, afirmou.
Barroso disse, em seu voto, que a posição de que não se pode cobrar a contribuição assistencial dos trabalhadores não sindicalizados levou à criação da figura do “carona”: aquele que “obtém a vantagem, mas não paga por ela”.
“Nesse modelo, não há incentivos para o trabalhador se filiar ao sindicato. Não há razão para que ele, voluntariamente, pague por algo que não é obrigatório, ainda que obtenha vantagens do sistema. Todo o custeio fica a cargo de quem é filiado. Trata-se de uma desequiparação injusta entre empregados da mesma categoria”, declarou.